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Afinal de contas, passaram mais de 20 anos...



Estava sentado no mesmo banco de sempre quando a avistei. Podia ter duvidado que fosse mesmo ela – afinal de contas, passaram mais de 20 anos e o meu estado de saúde debilitado poderia ter-me trocado as memórias -, mas houve algo dentro de mim que me deu certezas que era ela. Contudo, depois, eu pude contemplar os mesmos olhos azuis de sempre, as mesmas sardas nas maçãs do rosto e o mesmo sorriso doce. Era, definitivamente, ela.

Não evitei saltar do banco – tudo bem, saltar do banco é obviamente uma hipérbole, porque as minhas artroses de estimação já não me permitem fazer acrobacias dessas – e caminhar em direção a ela. Ficámos frente a frente e pude perceber pela mudança na sua expressão que também não demorou muito tempo a reconhecer-me.

- Umas rugas a mais, mas continuas igual ao rapaz que eras há… Quarenta e seis anos, não é? – ela disse, com aquele sorriso encantador a bailar-lhe nos lábios.

Desde esse momento, que as nossas palavras se tornaram muito vagas na minha memória. Não quer isso dizer que, naquele momento, eu não a tenha ouvido atentamente, é só que eu preferi guardar para mim o seu sorriso e as suas expressões. Guardarei também, eternamente na minha memória, o momento em que ela entrelaçou as nossas mãos, tal e qual como na altura em que tínhamos vinte anos e estávamos plenamente crentes que sabíamos tudo acerca do amor.

Mas não sabíamos, nunca soubemos e creio mesmo que, durante uma vida toda e toda a existência da Terra, são poucos os que realmente sabem. Se soubéssemos, teríamos percebido que era amor verdadeiro aquilo que sentíamos um pelo outro. E eu teria percebido mais cedo que ela é, sempre foi e sempre será a mulher da minha vida.



- Dona Elvira, está aqui um advogado para falar consigo. – a empregada do lar onde se encontrava a viver disse-lhe.

- Mande-o entrar.

O advogado entrou na sala pequena e acolhedora de Elvira, sob as suas ordens, trazendo consigo uma pequena carta nas mãos. Não lhe ocupava muito espaço nas mesmas, mas ele guardava-a como se de um tesouro se tratasse. Sentou-se na poltrona do quarto de Elvira, junta da mesma, e entregou-lhe a carta, mas antes que Elvira a abrisse, disse-lhe:

- Elvira, o meu cliente, Amadeu Oliveira, faleceu esta manhã e junto ao seu testamento, deixou esta carta endereçada a si.

Ela abriu-a e os seus olhos ficaram rasos de água ao lerem tais palavras.



«Só queria que soubesses que foste, és e sempre serás, a mulher da minha vida. – Amadeu Oliveira»


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